luvas na relva
quando o sol se poe e a poeira abaixa, minha gravidade se força a se colocar em pé. eu consigo ver claramente a luz que restava escapando dos meus dedos, e antes que pudesse tomar qualquer escolha, escolho compartilhar com vocês.
eu não acredito que existe nada além do que os nervos conseguem reagir diante da pelicula fina em volta da minha pele. meu deus é só um – a carne mais crua de todas. aquela que mora nas luzes da cidade, no domingo a noite, no amor que a gente sente por pessoas que conhecemos no fim de semana. vida real, ao vivo. o unico mundo que eu conheço. alem do prazer em excesso, o prazer de simplesmente estar aqui e fazer, existir, e presenciar as menores coisas que existem, que podemos assistir a olho nu. sempre me coloquei embaixo, e o que existe pra encaixar o silêncio constrangedor que coloca a prova da nossa existencia em risco, é o conforto de estar em silencio. nao existem testemunhas inocentes.
ocupar um espaço é sempre um sacrifico do que poderia estar no meu lugar, e sendo isso apenas carbono e oxigênio, acho que estou fazendo o melhor que eu posso, quando meus pés pisam na terra, quando meu pulmão respira ar fresco, e quando meu corpo da uma gargalhada. minha religião é o que eu não conheço, e nunca vou conhecer, dentro de tudo que eu já vi e ouvi, e o que senti logo em seguida. a única coisa sagrada é musica pop.
foda-se o que alguem tem a dizer sobre mim. foda-se o que eu já pensei sobre a organização milimentrica da matéria que forma o meu corpo. eu entendo o mundo real e seu funcionamento complexo melhor do que a maioria das pessoas, e ainda assim, não sei de absolutamente nada. não pretendo dar nenhum passo além. minha respiração já basta agora. palavras e promessas são cadeados, vidas e vazios são magia, morte é um adjetivo, somos ferramenta e ingrediente, e existir é infinito. eu amo causar impressões mas, agora, minha impressão é ausência e deslocamento, e todo o choque em torno disso. não tenho idade pra saber o que eu quero fazer amanhã, e minha luta é contra o que tentam fazer com isso. somos um percurso em curva. a fração de uma explosão completa. chuva em silêncio. superficies complexas. uma mão coberta cheia de cartas em branco, embaralhando a maior paisagem do mundo.